sexta-feira, 6 de maio de 2011

Wang Wei, Du Fu, Li Bai

[s/i/c]

Poesia Chinesa da Dinastia T’ang



-- Wang Wei --
Ocaso Cai

Ocaso cai sobre o pátio do mosteiro.
Pela janela aberta árvores desbotam no breu.
Lenhadores cantam pelos outeiros.
Monges respondem do vergel.
Pássaros vêm para o rocio das flores.
Lá, entre os bambus, alguém toca pífaro.
Ainda não sou velho,
mas me sinto um eremita.


Riacho-canto-de-ave

Ócio, caem flores de cássia.
Quieta noite, escarpas abaixo.
A lua vem despertar as aves
que, de esparso, cantam sobre o riacho.


*


-- Du Fu --
Chuva de Primavera

Uma boa chuva sabe seu tempo.
Cai no limiar da primavera,
e, da noite, rouba o vento --
quietude molhando a terra.
Breu, nuvens negras como trilhas.
Única lâmpada no barco.
De manhã, feitas de um só charco,
flores vergam suas silhas.



Pensamentos numa Viagem Noturna

Tênue brisa através do capim.
No convés sigo sozinho.

Estrelas debruçam-se sobre o baixio.
Luar, na cheia do grande rio.

Letras não trouxeram fama.
Cargo? Velho demais para a trama.

À deriva, quem mais sou eu?
Gaivota entre terra e céu.




 Ventos Errantes

Os juncos junto à porta
são esguios, elásticos

como os quadris de moças
de quinze estios.

Quem à alba disse
nada de novo ao redor’?

Um vento louco aqui passou
quebrando o maior.


*


-- Li Bai --
Pensamentos na Noite Calma

O piso antes da cama rebrilha,
luar, como geada, o quarto vaza:
ergo a cabeça e vejo a lua,
baixo a cabeça e penso em casa.


Nas Serras: uma Resposta ao Vulgar

Por que moro nos verdes altos?
Rio e calo, o coração calmo.
Brotos de pêssego somem na corrente.
E há outros céus e mundos fora este.


Bebendo tão-só com a lua

Jarra de vinho entre flores.
Bebo só, sem companhia.
Ergo um brinde à lua longa
somos três: ela, eu e minha sombra.

A lua não sabe beber.
Minha sombra imita meu passo.
Mas vou me divertir com ambas,
e a primavera está por um traço.

Eu canto -- a lua vem e vai.
Eu danço -- minha sombra salta, tonta.
Ainda sóbrios, trocamos alegrias.
Ébrios, e cada um por sua conta.

Sejamos amigos na medida do impossível.
E três até onde o horizonte visível.




NOTA – os próprios nomes dos poetas variam de acordo com o tradutor: Li Bai (ou Li Po), Du Fu (ou Tu Fu) e Wang Wei (ou Iuang Ui). Estes nomes são, per se, instituições na China. Até hoje estudados e reverenciados, apesar de sua poesia provir do séc. VIII e IX d.C. As traduções acima como quase todas as de poesia japonesa, chinesa e coreana encontradas por aqui foram feitas no ano de 1999, em São Paulo, e estão reunidas em um volume inédito de traduções – que além de poesia também inclui textos filosóficos, históricos, de ficção em prosa, e da natureza da pintura e do ideograma intitulado: Em Louvor das Sombras13 textos fundantes para compreender a estética Chinesa e Japonesa. Foram feitas a partir de versões para os principais idiomas ocidentais -- especialmente o inglês -- assim como notações fonéticas e alguma noção de como funciona a escritura ideogramática. 

* * *

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