quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Redes Sanguessugasociais

Lásló Moholy-Nagy, 1923


Gradações


Deixar o MySpace foi uma atitude digna. Discreta, talvez. E honesta. Até porque andava insatisfeito não com as composições em si – letras, progressões harmônicas, dedilhados, arranjos, instrumentação – mas com as deficiências, as limitações técnicas das gravações: mixagem, equalização, etc. Abandonar o Facebook foi um alívio – para minha caixa postal, inclusive. Agora, chispar do Twitter foi uma libertação. Algo análogo à travessia do Mar Vermelho. Como se tem mais tempo pra tudo. Para o mundo: céu, ruas, árvores, um café amargo e aromático, esquinas, livros, bichos, manhãs, gentes. Acho que tem até a ver com o fato de haver voltado a escrever mais; e, por tabela, postar mais por aqui.


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No Atacado

Peter Eisenman and Robert Cole, 1975



De "Doutores" e Números


O que causa alergia nos cursos de pós-graduação não é algo que resguarda um valor em si em relação a esses cursos. Pós-graduar-se, quer dizer, ter a a aspiração, o desejo de aprofundar conhecimentos que sigam mais além do que foi ofertado nas ralas graduações dos diascorrentes, é algo legítimo. 
O que não é legítimo é outra coisa, que independe disto. É uma questão de número: a megametria por detrás da coisa toda. 
Quer dizer, de uns tempos para cá, obter um diploma de doutor, por exemplo, converteu-se tão-só num "degrau de carreira". Mecanicamente. Algo que, na maior parte dos casos, nada tem a ver com legítimas aspirações, inclinações ou interesses pessoais dos doutorandos em elastecer o conhecimento individual ou aprofundar e dimensionar melhor algo que pode ser coletivizado, para um público mais amplo. Divisar melhor certos temas até então obscuros ou pouco tocados. Do contrário, o que há, mais e mais, tem a ver com a necessidade dos cursos de pós-graduação de se referendarem junto aos organismos que os monitoram.  O que equivale a dizer: desovar semestralmente certo número de teses. 
Aqui, o que menos importa é a relevância, a originalidade, a boa escritura, a qualidade, enfim, dessas teses. Afinal, elas constituem, no frigir da omelete, independente do mérito individual de cada uma, apenas unidades em si. Converteram-se em mera estatística para que o curso, por meio de mais esse critério numérico, seja bem avaliado pelos burocratas do CNPq e da Capes. 

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Aeroletras 1

Alfred Stieglitz, Aeroplane, 1910



7 dispersões
– um giro pelos suplementos literários do planeta



1. Abrigar a luz à sombra [http://bit.ly/cPOHKn]
Bom e breve obituário de Bernard Knox. Knox [1914-2010] foi um reputável tradutor, professor e estudioso do grego clássico. Escrevia soberbamente, como atesta o prólogo à tradução da Ilíada por Robert Fagles [Penguin Books]. Fiz questão de citar trechos desse magnífico prólogo num texto chamado Prefácio a Aquiles [encontrável na rede Aqui]. Knox estudou e, posteriormente, ensinou em Cambridge. Lutou na Guerra Civil Espanhola e na II Guerra Mundial, onde foi para-quedista. Portanto, sabia empiricamente do que estava falando ao tratar da violência da Guerra de Troia, e de seu principal protagonista. Knox parece ser da cepa daqueles europeus que estão desaparecendo: os que conheceram as vacas magras, o frio, a fome, a guerra, as bombas, a violência, a incerteza, o terror, o genocídio, a ruína, a privação. Quase foi morto na Espanha, onde lutou ao lado dos Republicanos, e onde foi deixado para trás, com a carótida aberta, desenganado, por seu próprio pelotão. Dele se pode repetir o que o obituarista, seu ex-aluno, declarou, em lucidez, haver sido sua tarefa de professor – por meio de um verso de Ésquilo – : “abrigar a luz à sombra”. No NYR of Books.


2.O Paralelo Dez: a fronteira da cruzada hodierna [http://bit.ly/aiZA2c
Livro de Christopher Caldwell, The Tenth Paralell, trata da verdadeira batalha travada entre cristianismo e islamismo na África contemporânea. Sem dúvida, a África é, de momento, “a fronteira espiritual”. Pelo  calor humano com que aborda a questão, distante de maniqueismos e habituais clichês jornalísticos ou mesmo biográficos, a obra merece leitura mais detida por parte de quem se interessa pelo assunto. O livro não se furta ao relato anedótico e até certa dose de humor. Na Slater.
Extenso perfil, cheio de verve, do orientalista Edward Said: “um homem que gostava da palavra 'estilo'” e cujo primeiro estudo foi sobre Joseph Conrad e a ficção autobiográfica. Difícil dizer se Said manter-se-á como teórico. Teórico, aliás, que traça relações entre o Ocidente e um Oriente, de início ficcionalizado e exotizado [pelo Ocidente] até a raiz dos cabelos. Mas tudo que faz menção a Conrad, nem que na tangência, merece ser sublinhado. O autor do artigo é Michael Wood. No London Review of Books.

4. Ficção na era do e-book [http://bit.ly/awv0mk]
Entrevista com Paul Theroux. O assunto? Livros digitais! Num determinado momento ele diz, quando questionado sobre a possível inflação de livros em função das excessivas facilidades da publicação digital: “mas não estão as bibliotecas abarrotadas de livros que ninguém lê?”. Convenhamos, é verdade! Na Atlantic Magazine.

5. Ações, subindo,descendo, montanharussamente na Bolsa de Valores Literária [http://www.guardian.co.uk/books/booksblog/2010/sep/24/author-reputation-dostoevsky]
De como a reputação de Dostoiévski foi avassaladoramente arrassada em 1846. Em certo blog do Guardian Books.

6. Richard Yates [http://nyti.ms/9IsLoL]
Romance de um jovem escritor americano, chamado Tao Lin [27 anos]. Leva o nome do outro escritor, mais famoso: Richard Yates. Talvez por tentar reviver a intensividade sinestésica do estilo de Yates. Mas o centro da trama é um amor juvenil que se dá entre Nova York e Nova Jersey. Ele tem 22; ela, 16. No NYT Books.

7. O Mundo que Nunca Houve [http://lat.ms/a0u2ZK]
Um estudo de como os atentados terroristas, as teorias conspiratórias e a difamação de agentes infiltrados, bem mais que os esforços de Marx, desacreditaram quase por completo o anarquismo. The World That Never Was – A True Story of Dreamers, Schemers, Anarchists and Secret Agents, massudo ensaio de quase 500ps. sobre o tema,por Alex Butterworth.  Uma delícia para quem aprecia o tema desde as compilações do velho e bom George Woodcock, ainda lidas, no segundo grau, nas traduções da L&PM. E obviamente perdidas em empréstimos a amigos [tss, tss]. Resenha no LA Times.



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terça-feira, 28 de setembro de 2010

E Unibus Pluram: Foster Wallace


Cindy Sherman, Untitled Film Still #3, 1998



Segue a tradução de trecho de um famoso ensaio de David Foster Wallace escrito em 1993. O artigo dá testemunho da fertilidade da mente de Foster Wallace. E de o quanto ele não se eximia de pensar em bloco a questão do escritor de ficção desde dentro. Concebendo-se a si próprio como parte do bando [bunch]. Não menos é comovente que haja uma visceral busca de verdade no que escreve. Como no trecho de artigo que se segue onde se toca na relação entre ficção e televisão via voyeurismo. Talvez por tudo isso, Foster Wallace seja um dos mais amados escritores americanos dos últimos tempos, e sua morte prematura, aos 46 anos, em setembro de 2008, tenha despertado tanta comoção. O título original do artigo é E Unibus Pluram: Television and Ficction in U.S. e pode ser lido na íntegra, em inglês, aqui: http://jsomers.net/DFW_TV.pdfEncontra-se dividido em duas metades: 1. Act Natural (Aja Natural; ou Seja Natural, se quiserem) e 2. The Finger (O Dedo). O que segue abaixo é a tradução de um considerável excerto da primeira parte:








E Unibus Pluram: Televisão e Ficção nos Estados Unidos.

Aja Natural

Escritores de ficção, como espécie, tendem a comer com os olhos. Tendem a esconder-se e encarar. No momento em que escritores de ficção cessam de mover-se, começam a esconder-se e encarar. São observadores natos. São espectadores. São aqueles no metrô cuja desinteressada fixidez guarda, de algum modo, algo repugnante. Quase predatório. Isto se dá porque as situações humanas são o repasto dos escritores. Ficcionistas observam outros seres humanos do modo como basbaques diminuem o passo ante batidas de carro: eles cobiçam uma visão de si próprios como testemunhos.
Porém ficcionistas como espécie tendem a ser terrivelmente auto-conscientes. Mesmo para padrões norte-americanos. Dedicando jardas de tempo produtivo ao estudo meticuloso de como as pessoas deles se aproximam, ficcionistas também gastam um horror de tempo produtivo a especular achacosamente como eles se aproximam das outras pessoas. Como aparecem, como parecem, como a borda de suas jaquetas deve flutuar à solta, ou se há marcas de batom em seus dentes, ou se as pessoas que eles estão observando podem eventualmente surpreendê-los como repugnantes espiões e bisbilhoteiros.
O resultado é que a maioria dos escritores de ficção, observadores natos, tendem a não apreciar serem objetos da atenção alheia. Serem observados. As exceções à regra –Mailer, McInerney, Janowitz – criam a especiosa impressão que muitos tipos de beletristas gostam da atenção das pessoas. Não é assim com a maioria. Os poucos que gostam de atenção a obtêm naturalmente em maiores doses. O resto de nós, menos, e comemos com os olhos.
Muitos dos ficcionistas que conheço são americanos com menos de quarenta. Não sei se ficcionistas com menos de quarenta assistem mais televisão do que outras espécies americanas. Os estatísticos reportam que se assiste cerca de seis horas de televisão em um lar americano médio. Eu não conheço um único ficcionista que viva em um lar americano médio. Suspeito que Louise Erdrich talvez viva. Falar a verdade, eu nunca vi um lar americano médio. Exceto na TV.
Assim meio de cara se pode divisar um par de coisas que assomam potencialmente relevantes, quanto aos ficcionistas americanos e sua relação com a televisão nos Estados Unidos. Primeiro, a TV opera um bocado de pesquisa predatória por nós. Como seres humanos, americanos conformam um bando evasivo e proteico, na vida real, dificilmente passíveis de serem tratados univocamente por um território literário que moveu-se de um naturalismo darwinista a uma cibernetismo pós-posmoderno em oitenta anos. Mas a televisão sobrevêm equipada com esse trato sintético. Se desejarmos saber o que é a normalidade americana – o que os americanos aspiram encarar como normal – podemos confiar na televisão. Pois toda raison da televisão é refratar o que as pessoas querem ver. É um espelho. Não um espelho à Stendhal refletindo o azul do céu e a poça enlameada. Está mais para o espelho do armário de banheiro diante do qual o adolescente monitora seu bíceps e determina seu melhor perfil. Essa espécie de janela sobre a tensa auto-percepção norte-americana é de fato inestimável, friccionável em sabedoria. E escritores podem ter fé na televisão. Há um bocado de dinheiro em jogo, afinal; e a televisão contém a melhor amostra que demógrafos dedicados às ciências sociais aplicadas têm a oferecer, e esses pesquisadores podem assim determinar precisamente o que os americanos nos anos 90 são, querem, veem: o modo que nós como audiência desejamos nos entrever. A televisão, da superfície ao fundo, diz respeito a desejo. Falando ficcionalmente, desejo é o açúcar da dieta humana.
A segunda coisa notável é que a televisão parece ser uma absoluta dádiva divina para uma subespécie humana que adora observar as pessoas mas detesta ser observada. Pois a tela da TV propicia um acesso em mão única. Uma válvula física de teste para bolas. NÓS podemos vê-LOS; ELES não podem NOS ver. Podemos relaxar, desapercebidos, enquanto comemos com os olhos. Creio que é por isso que a televisão tem também tanto apelo para solitários. Para enclausuramentos voluntários. Cada ser humano solitário que conheço assiste bem mais que a seis horas médias diárias dos outros americanos. O solitário, como o ficcionista, adora a observação de mão única. Pois as pessoas solitárias são em geral solitárias não por conta de horrendas deformações ou odores ou algo que as torna repulsivas – de fato hoje existem grupos de suporte social para pessoas com essas precisas características. Solitários tendem a ser solitários porque se recusam a enfrentar o custo emocional associado a se estar cercado de outros seres humanos. Eles são alérgicos a pessoas. As pessoas os afetam de modo forte em excesso. Chamemos o americano solitário médio de Joe Briefcase [Nota do tr.: algo como Zé Pasta (de documentos, dessas usadas por executivos. Mas a expressão também pode ser traduzida como "breve caso": Zé Brevecaso.)]. Joe Briefcase tão-só detesta o fluxo de auto-consciência que tão estranhamente surge somente quando outros seres humanos reais estão à volta, fixando, suas antenas-humanas eriçadas. Joe B. teme o modo como ele pode aparecer para observadores. Ele se põe ao largo do estressante jogo americano do pôquer da aparência.
Mas solitários, em casa, sozinhos, ainda anseiam por visões e cenas. Daí a televisão. Joe pode encará-LOS, na tela; ELES permanecem cegos para Joe. É quase como voyeurismo. Conheço pessoas solitárias que enxergam a televisão como uma verdadeira deus ex machina para voyeurs. E boa parte da crítica, da virulenta crítica, menos ponderada e mais salpicada sobre as redes, anúncios comerciais, e os espectadores indistintamente, tem a ver com a acusação de que a televisão nos tornou uma nação de complacentes voyeurs de queixo caído. A acusação constitui uma inverdade, mas por estranhas razões.
O clássico voyeurismo é espiacional: observar pessoas que não sabem que você está lá no que prosseguem com as prosaicas mas eroticamente densas tarefas da vida privada. É interessante a medida de o quanto o clássico voyeurismo envolve instrumentos de janelas emolduradas por vidros, telescópios, etc. Talvez essa moldura vítrea é o que faz a analogia com a TV tão tentadora. Mas a assistência da TV é um animal diferente do peeping tourism. Porque as pessoas que assistimos pelo vidro emoldurado da TV não são realmente ignorantes do fato de que há alguém as assistindo. Em verdade, uma vasta porção de alguéns. Em verdade, as pessoas na televisão sabem que é em virtude dessa enorme massa de alguens comedores com os olhos que se dá a própria razão de elas estarem na tela, ocupadas com gestos largos, de nenhum modo prosaicos. A televisão não propicia o verdadeiro espiacionalismo, porque a televisão é performance, espetáculo, o que por definição requer observadores. Não somos voyeurs, aqui, portanto. Somos meros espectadores. Somos a Audiência, megametricamente numerosa, embora com frequência a assistamos sozinhos. E Unibus Pluram.
Uma das razões pelas quais escritores de ficção parecem repelentes no plano pessoal é o fato de serem realmente voyeurs por vocação. Eles precisam desse direto furto visual de observar alguém sem ter de contrapor uma individualidade especialmente assistível. A única real ilusão no espionalismo é sofrida pelo voyeurizado, que desconhece que está fornecendo imagens e impressões. Um problema para muitos de nós, escritores de ficção com menos de 40, lançando mão da televisão como substituto do verdadeiro espionalismo, no entanto, é o de que o voyeurismo da TV envolve toda uma opulenta orgia de ilusões para o pseudo-espião, quando o assistimos. Ilusões é tudo que voyeurizamos aqui: os voyeurizados do lado de lá da tela estão apenas insinuando uma ignorância de serem vistos. Eles sabem perfeitamente que estamos do lado de cá. E a instância de nos encontrarmos aqui está por igual bem enfronhado nas mentes dos que se postam por detrás da segunda camada de vidros, as lentes e os monitores por intermeio dos quais técnicos e diretores desdobram-se sem nenhuma ingenuidade para lançar a imagem até nós. O que nós vemos está longe de ser roubado. É ofertada – ilusão. E ilusão que assistimos pela moldura envidraçada; não se trata de pessoas em situações reais que agem ou mesmo movem-se sem a consciência da audiência. O que jovens escritores estão vasculhando, os dados de certas realidades a ficcionalizar, já se encontram compostos por personagens em narrativas altamente ritualizadas. E mais, nós não estamos sequer vendo personagens
[…]




A aparição auto-consciente da ausência de auto-consciência é a grande ilusão por detrás da sala de espelhos de ilusões da TV; e para nós, a audiência, é simultaneamente remédio e veneno. […] Pois reparamos nessas pessoas raras, altamente treinadas, aparentemente não assistidas, seis horas por dia. E adoramos esse pessoal. Ao ponto de atribuí-los verdadeiras propriedades sobrenaturais e desejarmos emulá-los, nós como que os veneramos.
[...]



* * *



segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Embora o imenso domingo


Arshile Gorky, Nighttime, Enigma and Nostalgia, 1932




Dois Tratados Breves



I.

até quando rias
havia uma contenção
que remetia para
o misterioso
solo em que brotaste

geologia dos quartzos de serra
finas areias de praia
caindo em gotas
num relógio sem data

embora o imenso domingo 
caiba agora no suor
da mão fechada
segurando a página do livro
no quarto, em escaninho

e cada dedo contraído
dita uma sílaba
do nome em vão
trancado na mente

e de novo, e de cor,
em silêncio
como litania repete-se:



*   *   *



II.

saudade é uma palavra de sete letras que não precisa ser multiplicada por outras sete para causar maior dano. saudade rói mais nos domingos sem fim, em que nem mesmo o futebol é consolo. saudade é o título de um livro de carolina michäelis, lido num tempo em que tudo era menos por ela revestido. saudade é o bandido que ao adentrar o saloon silencia a valsa nos dedos do pianista. saudade é a última mensagem virtual em que li teu nome impresso dizendo coisas gentis. saudade é o inverso da lembrança que promete para breve uma presença.


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domingo, 26 de setembro de 2010

As três não Marias

Ellsworth Kelly, Orange, Dark Grey, Green, 1986




Quem não nota?




Há autores tão diferentes. Porém, por vezes, tão rentes que parecem a mesma pessoa escrevendo em diferentes idiomas, tempos, locais.

Quem não nota isto em Sylvia Plath, Alejandra Pizarnik, Ana Cristina César? Essa experiência limítrofe entre arte & vida?


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Bem me quer, mal me quer: Creeley

Otto Piene, Flower of Orange Fire, 1967


The Flower


I think I grow tensions
like flowers
in a wood where
nobody goes.

Each wound is perfect,
encloses itself in a tiny
imperceptible blossom,
making pain.

Pain is a flower like that one,
like this one,
like that one,
like this one.


Robert Creeley




A Flor

Acho que cultivo tensões
como flores
num bosque onde
ninguém vai.

Cada chaga, perfeita,
reveste-se em um tênue,
imperceptível botão,
causando dor.

Dor é uma flor como esta,
como esta,
como aquela,
como esta.


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O oco do tempo nos favos do relógio: Celan

Sheila Hicks, Blue Letter, 1959





Mit Brief und Uhr


Wachs,
Ungeschriebnes zu siegeln,
das deinen Namen
erriet,
das deinen namen
verschlüsselt.

Kommst du nun, schwimmendes Licht?

Finger, wächsern auch sie,
durch fremde,
schmerzende Ringe gezogen.
fortgeschmolzen die Kuppen.

Kommst du, schwimmendes Licht?

Zeitleer die Waben der Uhr,
bräutlich das immertausend,
reisebereit.

Komm, schwimmendes Licht.


Paul Celan



Com Carta e Relógio


Cera,
para selar o não escrito
que adivinhava
teu nome,
que o guardava
sob cifra.

Virás agora, luz sobrenadante?

Dedos, também encerados,
através de estranhos,
dolorosos anéis extraídos.
As bordas derretidas.

Virás agora, luz sobrenadante?

Oco do tempo nos favos do relógio,
milhares de abelhas acasalam,
em ponto de partida.

Luz sobrenadante, vem.


* * *


Para Gratidão


[s/i/c]


Eles Têm




Esta vai tão-só para agradecer os que me enviaram livros e revistas recentemente, como Luci Collin, Virna Teixeira, Everardo Norões, Renato Mazzini, Ednardo... 

Livros de capa, papel possuem o calor que esta postagem não tem. 


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sábado, 25 de setembro de 2010

Quando um dia a vantagem for água

Per Kirkerby, New Shadows III, 1996




Lavanda


a vantagem de si tira vantagem
a onda quebra sobre a praia

quando um dia a vantagem for água
sua onda da praia fará o nada

onde estão o molde de teu pé
tua sombra, o galho seco

com que riscavas a areia
esparsamente úmida

das gostas caídas de teu corpo



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