quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Un Duque de Alba

A Lezama

Por más de veinte años
un duque de Alba
permaneció echado en su cama.
Entre la mugre de sus detritus
y la lepra de un amor desdichado,
veía salir el sol y ponerse,
veía, como una tumba más, la noche.
El aire mefítico que respiraba
mezclado venía con la fragancia
de los azahares de su amada.

A este duque de Alba, tan feliz,
lo envidiamos noblemente,
nosotros, en edad asolada
por la tecnocracia y la desconfianza.
Este duque de Alba tenía un solo
pensamiento, una idea, pero suya.
Lo iba gastando,
y al mismo tiempo enriquecía.
Pero nosotros, en varias camas,
con mugres y millones de lepras,
entre planes y simulaciones,
ya no sufrimos nada.
Nos permiten tomar pastillas,
y callar.

Virgilio Piñera


Um Duque de Alba

A Lezama

Por mais de vinte anos
um duque de Alba
permaneceu encerrado em sua cama.
Entre o sebo de seus detritos
e a lepra de um amor infeliz,
via o sol sair, se pôr,
via, como uma tumba a mais, a noite.
O ar mefítico que respirava
vinha mesclado à fragrância
das flores-cítricas de sua amada.

A esse duque de Alba, tão feliz,
invejamos nobremente,
nós, em época assolada
pela tecnocracia e a desconfiança.
Esse duque de Alba, tinha um só
pensamento, uma idéia, mas sua.
Lha ia gastando,
e ao mesmo tempo enriquecia.
Mas, nós, em várias camas,
com sebos e milhões de lepras,
entre planos e simulações,
já não sofremos nada.
Nos permitem tomar drágeas,
e calar.



Nota – o poema é dedicado por Piñera ao escritor cubano Lezama Lima. A casa de Alba foi uma das mais afluentes e poderosas linhagens da nobreza espanhola. No séc. XVI, Dom Fernando Alvarez de Toledo y Pimentel, terceiro duque de Alba, ficou famoso ao desencadear uma violenta repressão às insurreições nos Países Baixos, que eram, à época de Carlos V, uma possessão espanhola. Este poema me foi enviado por um amigo e conversa bem articulado com certa postagem de um outro amigo, que anda lendo As Viagens de Gulliver. A postagem em questão encontra-se no blog Dessincronizado sob a rubrica 'Gulliver', 10.01.08.

3 comentários:

  1. o ruy,

    Este poema me foi enviado por um amigo e conversa bem articulado com certa postagem de um outro amigo, que anda lendo As Viagens de Gulliver??????????????
    (ludovico e aldir ???????????)
    Seria o modelo do sujeito que sofre de transtorno obsessivo-compulsivo canalizado para a higiene.
    postado por ludovico


    aldir brasil@yahoo.com.br

    abraços

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  2. é isto mesmo, aldir. o q. quis dizer: a visão de swift é personalíssima. dificilmente ele sobreviveria em nosso tempo sem somatizar alguma modalidade de distúrbio. e porque se sentiria como o peixe fora d'água. ou, se se quiser, como o nobre do poema de piñera. swift tinha lá algumas idéias. e elas ñ eram de empréstimo; eram, do contrário, mto. suas.

    abs.

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  3. E acho que ter idéias próprias chega a ser até generosidade para com a raça. Depois de alguns anos de pesquisas, talvez eventuais aliens decidissem não destruir esse planetinha meio mequetrefe, tendo em conta que "ora, há até gente que se mete a ter idéias...daremos então mais um ou dois séculos de sobrevida para ver o que conseguem".

    Para além disso, belo poema:

    "veía, como una tumba más, la noche"

    Esse verso vai para a antologia pessoal do Ludovico.

    Abraço, Ruy!

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