terça-feira, 19 de agosto de 2008

Aferindo o peso do mundo: Ginsberg


John Cassavetes, Love Streams, 1984



Song


The weight of the world
is love.
Under the burden
of solitude,
under the burden
of dissatisfaction

the weight,
the weight we carry
is love.

Who can deny?
In dreams
it touches
the body,
in thought
constructs
a miracle,
in imagination
anguishes
till born
in human--
looks out of the heart
burning with purity--
for the burden of life
is love,

but we carry the weight
wearily,
and so must rest
in the arms of love
at last,
must rest in the arms
of love.

No rest
without love,
no sleep
without dreams
of love--
be mad or chill
obsessed with angels
or machines,
the final wish
is love
--cannot be bitter,
cannot deny,
cannot withhold
if denied:

the weight is too heavy

--must give
for no return
as thought
is given
in solitude
in all the excellence
of its excess.

The warm bodies
shine together
in the darkness,
the hand moves
to the center
of the flesh,
the skin trembles
in happiness
and the soul comes
joyful to the eye--

yes, yes,
that's what
I wanted,
I always wanted,
I always wanted,
to return
to the body
where I was born.

Allen Ginsberg



Canção

O peso do mundo
é o amor.
Sob o fardo
da solidão,
sob o fardo
da insatisfação

o peso,
o peso que carregamos
é o amor.

Quem pode negar?
Em sonhos
nos toca
o corpo,
em pensamento
constrói
um milagre,
na imaginação
extingue-se
até nascer
humano—
salta do coração
ardendo de pureza—
pois o fardo da vida
é o amor,

mas suportamos o peso
cansados,
e então temos de descansar
nos braços do amor
oxalá,
descansar
nos braços do amor.

Nenhum descanso
sem amor,
nenhum sono
sem sonhos
de amor—
louco ou frio
obcecado por anjos
ou máquinas,
o último desejo
é o amor
—não deve ser amargo,
não deve negar
não deve persistir
se negar:

o peso é demasiado

—deve ser dado
sem nada
em troca
como o pensamento
é dado
na excelência
de seu excesso.

Os corpos quentes
brilham juntos
no escuro,
a mão se move
para o centro
da carne,
a pele treme
de contentamento
e alma sobe contente
até o olho—
sim, sim,
era o que
eu queria,
eu sempre quis,
eu sempre quis,
voltar
ao corpo
em que nasci.





Nota -- poema extensamente traduzido em português. Talvez a primeira versão seja de Claudio Willer, nos anos 80, para uma reunião, pioneira em livro, do trabalho de Ginsberg no Brasil. Devo ter traduzido este poema pelo menos uma meia-dúzia de vezes ao longo dos anos. Mas esta versão foi feita cinco minutos atrás. Ainda que Gisnberg tenha escrito muita coisa apenas passável, este poema é de uma beleza muito própria. Não acham? A foto de ilustração é um still de Love Streams, último filme de John Cassavetes. Na tomada, ele aparece com sua mulher, Gena Rowlands, a bela dama do teatro e do cinema norte-americanos. Curiosamente esse filme difícil, nada 'mainstream', era presença recorrente no 'Corujão' da Rede Globo aí pelos anos 80 e 90. Ao que parece Cassavetes como cineasta tem uma obra menos desigual que Ginsberg como poeta.

3 comentários:

  1. Belo. Tão perfeito. Levei-o, Ruy.

    Você conhece 'canção' de Louise Bogan? Gostaria muito de sua tradução.

    Beijos.

    Lembrei-me tanto quando vinha aqui e 'roubava' suas peças e nem avisava. A 'nota'(perdoa-me), vale mais que a peça em si. Acho que porque você está nela por inteiro. Não esqueci das traduções, não senhor.

    :)

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  2. as tuas traduções da mesma poesia são diferentes? que interessante se forem.
    antes desse poema, não gostava muito das coisas dele. esse driblou minha má vontade. bonito mesmo.
    obrigada, ruy.

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  3. pois é anna, a gente se muda leva as coisas, deixa outras. junta mto. papel joga uma parte fora... e vai perdendo coisas.

    bjs.

    querida cris, sentia sua falta. eram furtos ao avesso, aqueles seus no começo. você os tomava para divulgá-los, mesmo q. eles ficassem meio chinfrins naqueles seus blogues ricamente ilustrados, sua danada.

    bjs.

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