quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Para Ela



Sobre uma foto de F. aos vinte anos

O mar, o píer, a moça e seus descalços,
Na luz da tarde que brota de seus olhos,
Os pés pisando as tábuas em falsos
Passos: ela flutua acima dos abrolhos.
Tudo converge para o xis dos braços
Onde de novo o dia nasce em portefólio—
Como se conseguisse os próprio traços
Da água da tarde, logrados em espólio.
Ela está onde a cidade se equilibra
Sobre o mar com um petroleiro à deriva
Num sem andar que move mais que a vida—
A resolução da foto não retem sua fibra.
Nela, tudo balé, milagre, céu, saliva,
E, atrás, o Atlântico é só sua jazida.



Nota – o único texto não ilustrado deste blogue vai para aquela que, em beleza e continuidade, às vezes no empuxo de horas extraordinárias, soube acolher em seus braços as promessas e os fracassos de uma vida. Na verdade, este poema é um pouco a admissão de um contrasenso, pois, como diz o de Stratford: "conservar algo que possa recordar-te seria admitir que eu pudesse te esquecer."

2 comentários:

  1. Gostava de ler livros de poemas que contivessem notas assim. Acho que, se um dia lançar um livro, será cheio de notas. Do tipo: "Este poema foi escrito numa terça-feira. Uma dessas terças que você jura que é sexta-feira, num abril assim que você jura que é outubro, num fim de mundo estranho que te juram que é onde você nasceu". Belo poema! O do Larkin mais abaixo também. Abraço!

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  2. Opa, leal Odorico, [o leal é para manter a tradição do epíteto, grande, estimado, compadre -- mas ñ é só força de expressão], bacana q. tenha gostado. quem sabe a gente não inaugura um novo gênero: a nota. se bem que é isso mesmo. gêneros não existem mais. já foram devidamente desconstruídos. de, resto, cê anda muito chique: escrevendo poemas satíricos em inglês no 'dessincronizado'! é o q. há!

    forte abraço,

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