[s/i/c]
No fim, tudo é história com H, até o Prêmio Nobel da Paciência
Guimarães Rosa errou pouco e morou longe. Talvez um de seus erros mais espessos: ter cindido a palavra história entre história e estória. Uma importação do inglês que teríamos passado melhor sem. É muito mais estimulante a ambiguidade que a palavra história – valendo igualmente para ficção e não-ficção, para Napoleão e para a anedota de botequim – concentrava em português. No meu léxico pessoal, não há estória. Para muitos puristas também. Em Portugal, parece, se emprega pouco. Ou não se emprega. Mas minha razão não passa pelo purismo da língua, senão pelos ecos semânticos da palavra. E que palavra! Lembro que, instintivamente, foi uma das primeiras coisas que fiquei remoendo depois de o professor de português da sétima série haver mencionado o fato. No caso, com regozijo, como se celebrasse mais uma proeza do engenho de Rosa. Mas já àquela época eu sentia que havia algo errado, que faltava Xerazade naquilo. Que, ao contrário do que o professor tentava nos sugerir: a história começa hoje, e continua amanhã. Nela, tênue o limiar entre realidade e ficção.
NOTA - se isto fosse dito em um artigo acadêmico, encheria catorze laudas, com um abstract em inglês, dezessete notas e vinte e duas citações. E o leitor medianamente sadio, que aguentasse ler até o fim receberia o Premio Nobel da Paciência. Tipo passar a noite inteira com aquela gota caindo da torneira e torrando o sossego do teu sono.
* * *
Nenhum comentário:
Postar um comentário