sábado, 14 de maio de 2011

E o peixe movia-se em câmera lenta

[s/i/c]

As Amigas

Num restaurante à beira-mar, duas amigas.
Eu queria que G.R. fosse uma marca de chocolate de muito sucesso – disse a outra.
Por quê? – disse a uma.
Porque aí não se esgotaria nunca. A gente ia poder desfrutar de algo inédito dele, de sua obra, sempre que desse na telha.
No aquário, entre as bolhas propalando-se no verde-turvo das águas, a lenta revolução das algas imantava a atenção da uma. Os pequenos dutos limosos. E o peixe dourado, de vasta calda movia-se em câmera lenta, enquanto os menores, por espasmos, cruzavam os sete mares com a propulsão de torpedos para então deterem-se, súbitos.
Alguém puxou as persianas da tarde. A luz abrandou. E um matiz de azul-cobalto pairou sobre as ondas com um demão de orquídeas-da-serra.
O bicho-homem é um labirinto – a uma, que foi a segunda a aparecer por aqui, disse, e sorveu o capuccino.
Fato. Depois eles dizem que complicadas somos nós – a outra disse.
Um silêncio de vapores d'água sobre xícaras percorreu o café. E a brisa entortou o oleandro no vaso, sob o toldo. Pagaram a conta. E, depois de a motocicleta ensurdecer a tarde, a primeira – que foi a segunda a aparecer, já disse, mas terá sempre a precedência no coração do autor – depôs, à saída do semáforo:
Mas eu estava falando da gente também.
Ei, olhe p'ronde 'cê tá indo. Acha que é fácil ir na garupa?
A outra abraçou-a contra si. Abraçou-a com ternura. E, completamente rendida, deslizou a mão pelo antebraço até os dedos da uma, que embreavam as marchas. Seus cabelos esvoaçavam sob os capacetes e a brisa da Avenida Beira-Mar semelhava aumentar ainda a mais a velocidade da moto.
Elas eram extraordinariamente jovens e belas.

* * *

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