[s/i/c]
Os Amigos
Amigos, amigos, negócios em toda parte. O executivo sabia do interesse do jovem redator pela secretária. Ela tinha cabelos curtos, era ruiva, e as leves sardas que lhe respingavam o rosto. Tinha também aquele fluido sotaque carioca, que parece levar vantagem até quando se desculpa. Não digo, feito o poeta, que vê-la à luz do sol era testemunhar a morte do marxismo; e, no entanto, nela as formas menos que as de um violoncelo não eram curvas. Ainda quando ocultas sob episódicos overalls.
Naturalmente era amante do executivo. E não desgostava. Embora fosse voluntariosa. E, logo, não morresse por isso.
Ela indagou ao chefe o que fazer. E este estava de olho nas contas. E no quanto a habilidade com as palavras do redator, recém-contratado, redundava no aumento de anunciantes, e polpudos depósitos bancários:
–Faça-se de difícil. Depois, você sabe. Mas, então, seja intensa. E, uma vez a casa aberta, passe a trava. Daqui uns tempos, vai estar comendo na sua mão – disse ele, girando na poltrona.
A moça seguiu à risca o roteiro.
Cafés. Bistrôs. Cinemas. Motéis, enfim. Depois longos serões de futebol e filmes nos apartamentos respectivos:
–Perfeito – assentiu o executivo ao receber o relatório, a cinza do cigarro expurgada pelo polegar à base da piteira de nácar.
–Bata mais um pouco nele – disse o executivo num entrebocejo – E aí Aníbal transpõe os Alpes. E ele vai estar comendo na sua mão.
–Na sua mão – repetiu ela em piloto automático.
–Na sua mão – repetiu ele em piloto automático.
Algo no entanto dera errado.
–Bota mais um pouco – ela dizia, manhãs sem data, no apartamento do jovem redator.
Enquanto ele entornava alpiste, tipo fubá, na palma da mão.
* * *
Nenhum comentário:
Postar um comentário