quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Over Wols

Wols, Ohne Titel,  c. 1945

Wols (Alfred Otto Wolfgang Schulze), Oui, oui, oui, 1947



Een kleine nota

.                                      "Maar zolang er sterren boven je zijn"

O que ressalta no informalismo do pós-guerra é atualidade mutilada do corpo. 
Isso nos Estados Unidos deságua em expressionismo abstrato. Em pintura gestual sob o impulso de jazz. Em Jackson Pollock. 
Na outra banda do Atlântico Norte isso vai dar no tachismo. Em um abstrato lírico, um tanto sortido – mas pouco geométrico, em geral. Uma espécie de anti-cubismo. Que pode, por exemplo sugerir entidades proto-fecundadas que são simultaneamente de dois reinos: vegetal e animal: como em Wols. Como se em Wols, às vezes, houvesse uma mirada pela lente de um microscópio.
Close-ups são rudes”, nos sugere Auden.
Wols, que além de pintor era excelente fotógrafo, sabia disso. E em alguns de seus quadros há tanta proximidade do objeto que parece poro, que parece célula, que parece bactéria. Escama. Bulbo. Ruga. Estria. Gema. Alga. Verruga. Bráctea. Fibra. Limo. Lâmina epidêrmica. 
Wols viveu a guerra na pele: exílio e campo de prisioneiros. Firmou essa paisagem de exílio.  Só que de tão perto, que chega a abismar. Depois de abandonar uma graduação em etnologia e passar pela Bauhaus, por sugestão de Moholy-Nagy,  buscou na França, ainda livre, um alívio, quase autista, em seus desenhos, aquarelas e águas-fortes povoados de micro-talhes, semelhando entes biológicos. Ou enleados de pelos, pentelhos, grandes vaginas sem o plástico amparo das pernas. Ou então ramas. Algas. Ou então amêijoas. Ou cracas. Ou moluscos não classificados por Lineu. Ou.
Wols, como Benjamin, esteve em Ibiza e no sul da França. Tinha múltiplos interesses: fotografia, cinema, pintura e era também músico. Em sua foto mais famosa surge um coelho esfolado.
Descobri Wols por meio de Antônio Bandeira, de quem foi amigo. Pesquisando sobre Bandeira. Todavia, Wols assoma menos geométrico que Bandeira. Morreu, no entanto, ainda mais jovem, aos 37 anos. De infecção alimentar dizem uns. De alcoolismo, segundo outros.
Wols concretiza não o objeto, mas a imagem sonhada que inexistia [desse objeto]. Há qualquer coisa de muito intuitivo. De muito profundo, direto. Simples.
Algo que avessa em sentir a hora de pensar. Que ao mesmo tempo que convoca o olho, convoca a mão. Que ao convidar a mão, convida o nariz. Que ao solicitar o nariz, solicita o ouvido. Que ao chamar o ouvido, chama o sexo. Que.
Faz os sentidos alternarem-se por turnos.
E de algum modo misterioso ele, que era alemão, parece mais perto da tradição dos grandes pintores flamengos.


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