segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Isso já ocorreu uma vez

Alfredo Camisa, s/d


A Filosofia da Fotografia e a Miopia de Esquerda

A esquerda brasileira causou muito prejuízo à inteligência do país por imbecilidade. Redução, patrulha. Entre os lesados por esse sinistro controle (semelhante ao fascista), de podar modos de viver e pensar em desconforme com a cartilha da esquerda, se encontra Vilém Flusser.

Flusser que, hoje, é muito mais conceituado internacionalmente, como teórico, que, digamos, Haroldo de Campos ou Alfredo Bosi ou Florestan Fernandes. E cuja visão da fotografia e dos processos eletrônicos apenas começa a ser mais debatida e divulgada.

Em sua teoria da fotografia [Towards a philosophy of photography] Flusser, já na abertura, propõe dois divisores de água na cultura humana: a descoberta da escrita linear e a invenção da imagem técnica.

Flusser também dispõe a fotografia como uma superfície que contem uma abstração. Algo que não está ali, agora. E, portanto, para ser captada em todas suas dimensões necessita de um olhar que, ao invés de jogar sobre ela um relance, a escaneie. Em seguida Flusser, de um modo quase ingênuo tenta separar os domínios da fotografia dos domínios da história sob o argumento de que na história tudo é irrepetível – como se mesmo uma cópia de uma foto pudesse ser inteiramente igual ou idêntica à outra, ainda que reproduzida eletronicamente.

Já a fotografia estaria nos domínios da magia. Isso porque as imagens, que no princípio eram mediações entre o ser humano e o mundo, mapeando-o para nós, converteram-se, desde que renunciamos à decodificá-las, em mais um elemento opaco, a que ele chama de idolatria. Ou seja, a projeção de imagens ainda “codificadas”. E desde que o homem se sente inepto a decodificá-las, ele tende a idolatrá-las em recalque.

Flusser alerta, no entanto, que isso já ocorreu uma vez na história da humanidade. Essa rebelião contra a imagem. E que foi justamente essa sublevação o que propiciou o surgimento da escrita linear.

As teorias de Flusser por mais excitantes que sejam - e elas o são - devem ser vistas com serenidade. Com sobriedade. Nem exaltadas, nem condenadas em bloco – por exemplo, por usarem termos bastante datados – ou no mínimo discutíveis – como “alienação”.

O certo é que Flusser caiu na voga de momento. Há teses que o comparam ao Radiohead. E os que escrevem melhor sobre ele, esquadrinhando a riqueza de suas sugestões, o fazem ao largo da feira pós-moderna em que se converteu sua teoria para o repasto acadêmico enquanto moda.

Em sua biografia, no entanto, fácil perceber que Flusser foi desligado da USP não pelo regime militar, mas pelos aparelhos de esquerda, que o viam sob suspeita. Pelos intelectuais da Universidade de São Paulo, que cartorialmente exigiram, deste que é um dos maiores teóricos da fotografia, desde Benjamin, uma titulação formal que ele não possuía – como se fosse impossível ministrar aulas em uma instituição de ensino superior por notório saber.


* * *

Nenhum comentário:

Postar um comentário