sábado, 20 de novembro de 2010

O indomável Caim de sua raça

[s/i/c]




Ainda Melville: Baleias-fins, Quakers & o Espírito do Capitalismo


O capítulo Cetologia, o 32, um dos mais longos do Moby-Dick, é de escasso valor informativo, hoje em dia. Quer dizer, vale inteiramente pelo estilo. Pelas volta e meia sápidas sentenças, típicas de Melville. Frequentemente tecendo analogias com a Bíblia, como quando discorre sobre a baleia-fin (também conhecida como rorqual-comum, em português): “this leviathan seems the banished and unconquerable Cain of his race” [este leviatã parecer ser o banido e indomável Caim de sua raça”]. As informações de história natural compiladas por ele estão completamente ultrapassadas. Assim como o plano fato de Melville ainda considerar o cachalote como o maior animal vivo, quando, hoje, se sabe ser a baleia-azul. E, depois dela, a própria baleia-fin. A baleia-azul, maior, embora bem mais ágil que o cachalote, só veio a ser caçada em larga escala de início para meados do séc. XX, ou seja, o interesse por sua caça – a reboque do desenvolvimento dos arpões mecanizados – se deu 50 anos após a escritura de Moby-Dick. Como era difícil mensurar sua extensão na água, julgava-se que o cachalote, mais conhecido, porquanto caçado maciçamente, fosse maior.

É interessante também constatar que o grande cachalote branco do romance de Melville foi inspirada em uma baleia real: Mocha Dick. Essa baleia, incomumente branca – possivelmente albina – tinha fama de feroz. E há registros dela desde 1810. Destruiu barcos e matou baleeiros ao largo da Ilha de Mocha, no Chile. E, no entanto, foi abatida em 1838. A exemplo de Moby-Dick, possuía já muitos arpões fincados no corpo. Alguns deles cravados por arpoeiros de Nuntacket, esse prismático pequeno porto insular, ao largo da costa de Massachusetts; então, quase que exclusivamente habitado por baleeiros e quakers. A descrição da avarícia de alguns desses quakers faz lembrar Max Weber, que muitos anos depois de Melville escreveria A Ética Protestante e O Espírito do Capitalismo [1905].

Aliás, dois aspectos saltam aos olhos em Melville: o elogio da democracia e a total ausência de racismo ou homofobia.


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