domingo, 4 de janeiro de 2009

Redemunhava sobre a rédea do vento: Hopkins


[s/i/c]




The Windhover


To Christ our Lord


I CAUGHT this morning morning’s minion, king-
dom of daylight’s dauphin, dapple-dawn-drawn Falcon, in his riding
Of the rolling level underneath him steady air, and striding
High there, how he rung upon the rein of a wimpling wing
In his ecstasy! then off, off forth on swing,
As a skate’s heel sweeps smooth on a bow-bend: the hurl and gliding
Rebuffed the big wind. My heart in hiding
Stirred for a bird,—the achieve of; the mastery of the thing!

Brute beauty and valour and act, oh, air, pride, plume, here
Buckle! AND the fire that breaks from thee then, a billion
Times told lovelier, more dangerous, O my chevalier!

No wonder of it: shéer plód makes plough down sillion
Shine, and blue-bleak embers, ah my dear,
Fall, gall themselves, and gash gold-vermillion.


Gerard Manley Hopkins



O Milhafre


A Cristo Nosso Senhor


COLHI esta manhã esse carcereiro de manhãs, reinado
De delfins d'aurora, malhado-manhã-marcado Falcão, galopando
O invariável ar de espiralado plano abaixo dele, trotando
Bem alto, como redemunhava sobre a rédea do vento volteado
Em seu êxtase! e logo ao largo, ao largo ao longo, dançando
Como um talão de patim circunda macio a curva em declive: de vez e planando
Rebatia o vento forte. Meu coração segredado
Pulsa por um pássaro—o alcançar de um; da coisa, o riscado!

Beleza bruta e valor e ato, oh, ar, pompa, pluma, inteiro
Laço. E o fogo que então de vós emerge, um bilhão
De vezes mais gostável, mais de risco, oh meu cavaleiro!

Não admira: o reto retardo torna o arar fundo vão
Fulgor, azul-lassa brasa, ah companheiro,
Falha, fel por si, e áureo-escarlate rasgão.





Nota - milhafre (falco subbuteo) é uma espécie de gavião, de falcão encontrado no Velho Mundo. Hopkins os observava particularmente em sua estadia no País de Gales, nas cercanias de um mosteiro próximo a Saint Beuno, onde prosseguia seu noviciado como jesuíta.


4 comentários:

  1. Rui,
    Tanto que você dizia que Hopkins era intraduzível... Não esperava por ele aqui, com seus sprung etc e tal, se é que me lembro da nomenclatura. Tudo muito cerebral e ainda assim alucinante, como o The Wreck of the Deutschland.

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  2. olá, cláudio,

    é isto. em certos casos a gente lança a tradução já pedindo, de antemão, que não se note o quanto ela é mesquinha diante do original. ainda estou para ver versões de Hopkins para o português que passem ao largo desse procedimento-desculpa-antecipada. esta não foge à regra. mas o original é uma beleza, como v. percebe. retorna à aliteração. ao recurso da aliteração como fundamento da poesia em inglês. e q. já está lá pelo 'the seafarer'.

    abs.

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  3. Ruy,

    A dificuldade da tradução do inglês começa no fato de que é uma língua sintética e polissêmica, em oposição ao analítico português. O inglês é ainda muito mais fortemente onomatopaico, o que cola ainda mais a sonoridade ao sentido (o que se há de perder, claro, na tradução). Acresce que há, ainda, a questão do peso sonoro das palavras. Veja você que num inspirado soneto inglês, de, digamos, Shakespeare, cabem muito mais palavras que na tradução. Tenho aqui uma dos sonnets completos, mas, se não se lê o original... De qualquer forma, acho que foi o nosso Pound quem disse das vantagens de se ler numa língua que se sabe solfejar, mas da qual não se tem completo domínio. Pega-se o ritmo, os timbres, as tonalidades, sem que o sentido rematado da tradução vicie o original. O pior que pode haver é "ver" as palavras em um idioma e "lê-las" mentalmente em outro. De qualquer modo, não foi só no Hopkins que você aceitou desafios. O último verso de Of a mere being, de Stevens, é de recuperação impossível em português. O que não significa que não devamos traduzi-lo. A tradução é um fracasso antecipado, alguém já disse, mas indispensável. Eu, por aqui, sigo numa forma precária de O Relógio, de Baudelaire, e o Palácio Promontório, de Rimbaud, às quais me dedico, com minucioso insucesso, há quase uma década...rs

    grande abraço
    Cláudio

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  4. Ruy,

    Me ocorre uma coisa bem prosaica. Veja o vocábulo "blue", com sua sonoridade cava, profunda, em oposição ao sinônimo usual em português "azul", que abre com uma vogal pura para uma vibração logo oclusa e um "l" que inexiste no português do Brasil foneticamente como tal. Então um "deep blue" (além de um obsoleto computador jogador de xadrez) é quase um mergulho sonoro no "som azul", com direito a baque surdo ou entrada vertical de saltador profissional. O nosso "azul profundo" (se for essa a solução que melhor atenda ao sentido num determinado verso) é de uma indiscrição brutal, com esse "r" no meio. Isso sem falar do outro sentido de "blue", como bem aproveitou Gerswhin na sua Rapsódia de tão feliz título. E, convenhamos, "rocking-chair" (que à varanda e vazia é uma imagem da morte em tantos blues) é uma palavra rangente, indecisa, ao sabor do vento e do olhar.

    grande abraço
    Cláudio

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