domingo, 1 de fevereiro de 2009

Para cada Gide, dez Baudrillards


Susan Sontag em 1966 - [s/i/c]



Contra a Cordialidade


Para a cordialidade do resenhismo acrítico – que, com honrosas exceções, grassa como praga nos suplementos de cultura e segundos-cadernos – algo no limiar destas palavras:


“Há homens que trabalham oito horas por dia e fazem o grande esforço de ler à noite para se instruírem. Não podem dedicar-se à verificação nas grandes bibliotecas. Acreditam na palavra do livro. Não se tem o direito de lhes dar de comer falsidade.”
[Simone Weil, trad. de Maria Leonor Ribeiro]

“O número de pessoas que deram aos intelectuais sua boa reputação de criadores de caso e de vozes da consciência sempre foi reduzido. Os intelectuais que assumem posições com responsabilidade e se põem em ação em favor daquilo que acreditam (em oposição a pôr sua assinatura em abaixo-assinados) são muito menos comuns que os intelectuais que assumem posições públicas em estado de consciente má-fé ou de ignorância descarada acerca do que estão defendendo: para cada André Gide, George Orwell, Norberto Bobbio, Andrei Sakharov ou Adam Michnik, há dez Romain Rolland, Iliá Erenburg, Jean Baudrillard ou Peter Handke, etc., etc. Mas poderia ser de outro modo?
[Susan Sontag, trad. de Rubens Figueiredo]


A fome de verdade de Weil. A declinação de nomes com todas as letras e pingos nos is, de Sontag. Ambas ensinam-nos a não nos nutrir de qualquer respeito à cordialidade buarqueana das trocas de favores. Ou à certa obliqüidade, que sequer sabe extrair desse expediente algum bom-humor, mas está mais ocupada em fortificar as trincheiras de Narcisópolis. E por meio de um apreço devotado não à arte, mas ao poder e a estratégia de alastrar um bocadinho de espaço na mídia.

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