Sozinho
I.
Certa
manhã de fevereiro eu quase morri aqui.
O
carro derrapou de banda no gelo, para
a
mão contrária da via. Os carros cresceram -
seus
faróis – acercando-se.
Meu
nome, minhas filhas, meu emprego,
partiram-se
frouxos e foram largados mudos e para trás
mais
e mais distantes. Eu seguia anônimo
como
um menino no playground cercado por inimigos.
O
tráfico que avizinhava-se tinha luzes enormes.
Elas
rebrilhavam sobre mim no que eu girava a direção
num
terror transparente que flutuava feito clara de ovo.
Os
segundos cresciam – havia lugar neles -
cresciam
tão magníficos quanto prédios hospitalares.
Dava
para repousar,
tirar
um respiro
até
ser atingido.
E
então algo fisgava: um comiserado grão de areia
ou
uma esplêndida rajada de vento. O carro desprendia-se
e
soçobrava ágil logo acima da pista.
O
poste atingido partia-se – num tinir agudo – e
despedaçava-se
no escuro.
E
então – silêncio.
Eu
afundava sob o cinto de segurança
e
enxergava alguém chegando pela neve indistinta
para
ver o que me sucedera.
II.
Venho
caminhando faz tempo
pelos
campos gelados de Östergötland.
Não
encontrei com ninguém.
Em
outras partes do mundo
há
aqueles que nasceram, viveram e morreram
numa
multidão perene.
Ser
visível sempre – viver
num
enxame de olhos -
deve
derivar uma expressão especial.
O
rosto moldado na argila.
O
murmúrio sobe e desce
enquanto
eles repartem entre si
o
céu, as sombras, os grãos de areia.
Eu
necessito estar só
dez
minutos de manhã
e
dez minutos de noite.
-Sem
um programa.
Todos
fazem fila na porta de cada um.
Muitos.
Um.
Tomas
Tranströmer
NOTA
Feita a partir de uma versão do sueco por Robin Fulton e alguma sondagem do original. Há mais
dois poemas de Tranströmer traduzidos em Afetivagem.
Sombrio e bonito. Mas não vai um aniversário pra gente...
ResponderExcluirNANDA
já foi, n.
ResponderExcluirExcelente...principalmente prá quem já deu com o carro num poste numa via quase deserta aos 17 anos.O tempo pára, anda devagar, a gente se confunde, vê sombras, perde a consciência, volta e sobrevive.
ResponderExcluirA diferença é que fazia muito calor!!!
é, ñ sei. no calor pelos menos a gente toma uma cerveja depois dos pontos.
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