domingo, 22 de abril de 2012

A Retórica de Leonard Cohen e os Tribunais



Da intoxicação letal da vingança para as sábias práticas da auto-reforma

Gostaria de agradecer à corte, na pessoa de Vossa Excelência, pelo modo cordial, ponderado e elegante com que os procedimentos se desdobraram. Foi um privilégio e um aprendizado testemunhar diante deste tribunal”. Assim se expressou Leonard Cohen, 77, após a sentença que lhe deu, esta semana em Los Angeles, ganho de causa no processo que moveu contra sua ex-empresária, Kelley Linch, 55, por assédio. O bardo canadense, cujas letras já chamavam atenção antes mesmo de serem musicadas - na verdade, mais ditas, num tom de barítono profundo, que cantadas  - alegara que vinha sendo sistematicamente perseguido por Miss Linch. 

A ex-empresária foi condenada a um ano e meio de prisão – com condicional nos cinco anos subsequentes - depois que se verificou o teor de milhares de mensagens de voz e centenas de imeios em que ela o ameaçava. E só não o chamava de santo: “pervertido”, "safado", “ladrão”, "velhaco" e insinuava que ele devia ser “sequestrado e eliminado”. Isso para não falar das impublicáveis. Embora essas, para não toar fora do figurino, façam referência à anatomia e à virilidade de Cohen.

'O Cohen tem de ser enforcado' não é algo lá muito agradável de ouvir”, ponderou o cantor canadense diante dos jurados.

O caso ganhou certo tempero e momento quando Cohen admitiu que havia tido um affair com a ex-empresária: “uma breve ligação íntima”, em suas sempre medidas palavras. Isso, antes de demiti-la e processá-la, em 2005, sob a acusação de ela lhe haver surrupiado a bagatela de 5 milhões de dólares. À época, a justiça americana deu ganho de causa a Cohen. Mas o processo esteve sujeito a revisões e apelos em outras instâncias.

Alguns jornais, entre eles o Guardian, sugerem, no entanto, que os fãs de Cohen devem agradecer de pés juntos à Senhorita Linch. Aparentemente o alegado furto dessa importância foi o estopim da volta de Cohen aos palcos. Há anos o músico vivia recluso em um mosteiro budista na Califórnia: meditando. Para todos os efeitos, sem a menor intenção de brindar o mundo exterior com sua graça. Porém, aos poucos, Cohen deu-se conta de que seria necessário organizar uma turnê capaz ressarci-lo dos alegados prejuízos, se desejasse viver sem perturbações. Sua digressão de 2008-09 foi reputada como um sucesso estrondoso, o que lhe rendeu cerca de nove e meio milhões de dólares. Além disso, um tanto por conta, ele ganhou o prêmio Príncipe das Astúrias, ano passado, e pôde, assim, voltar à sonhada reclusão. 

Cohen, à sua vez e sem perder o tom, saiu-se com as seguintes palavras conclusivas sobre o processo: “Eu gostaria de agradecer à arguida, Senhorita Kelley Linch, por haver insistido em um julgamento, facultando assim à corte a observação de suas profundas, deletérias, implacáveis estratégias de escapar aos seus malfeitos. Está nas minhas preces que a Senhorita Linch encontre refúgio nos ensinamentos de sua religião, e que um espírito de concórdia mude seu coração do ódio para a contrição, da intoxicação letal da vingança para as sábias práticas da auto-reforma”.

Pelo visto, a eloquência do autor de “Hallelujah” - aqui combinada a uma evidente polidez - não se limita só às letra de música. Ou de nenhum modo desadestrou-se no isolamento de suas práticas budistas. Resta saber com que disposição de ânimo a ré terá recebido essas sábias recomendações. 

4 comentários:

  1. Hhahahaha...adorei...esta resposta eu gostaria de ter dado outro dia para uma pessoa que bem merecia!!!

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  2. e o tempo verbal. se merecia, é porque já está no passado. e o bom é não comer fígados.

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  3. esse cabra se não for santo é de um sarcasmo clínico. tadinha da empresária

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  4. nobody is perfect, já dizia billy wilder. nem mesmo os budistas

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