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Modus Espelendi Parvulos e o Cu da Gia
João Nogueira é mesmo um cronista surpreendente. Basta se ler dele notícia sobre os antigos lampiões de rua, que se acendiam queimando azeite de peixe. O modo talhado como Nogueira os descreve vale mais que uma sequência de fotos. Ou então, sua crônica sobre os antigos e lúgubres enterros noturnos, para se dimensionar a profunda modificação da relação entre o homem e a morte numa capital provinciana do Brasil, durante o espaço de algumas décadas, a partir de meados do séc. XIX. Ou as metamorfoses do senso de religiosidade embutidas nessas descrições. Ou o quanto os costumes se modificam numa vertigem sem peias. A procissão de penitentes, cuja vanguarda, segundo a lenda, deitava-se ao limiar da Igreja do Rosário para ser pisoteada pelos que vinham atrás. Para indicar, quem sabe, que os últimos seriam os primeiros. Ou os salmos alegres que se cantavam quando morria uma criança, um "anjinho". E o padre oficiante do enterro enfiava pela Rua das Flores (atual Castro e Silva) com um largo sorriso no rosto como que conduzindo uma pequena festividade, à frente do esquife, escoltado por um bando de coroinhas, seguido do maior número de crianças que se poderia reunir à ocasião, ao modo de uma ciranda organizada. A esse antigo rito católico dava-se o nome – provavelmente num latim estropiado ou gralhado – de Modus Espelendi Parvulos. Ou o inventário dos nomes antigos de ruas, praças e logradouros de Fortaleza. O antigo descampado onde se situa, hoje, o Mercado São Sebastião, ao início da atual Av. Bezerra de Menezes, por exemplo, era conhecido por todos os fortalezenses, desde os com títulos de nobreza aos carregadores de tonéis onde se acumulavam as fezes de uma residência nos tempos em que não havia esgotos, de O Cu da Gia.
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