O time do Fortaleza Esporte Clube, campeão cearense de 1974
olha, Airton, eu me lembro de uma crônica tua e eu estar morando em São
Paulo. Morrendo em São Paulo. E te digo, com desconcertante firmeza: nem sempre achava que as tuas crônicas fossem a última
cocada preta, meu velho, ou o mais recente fax do Parnaso; e, porém, naquela me
atingiste como numa pedrada. E então, golpeado nos brios – falso orgulhoso Golias, que não se suspeitava David – sangrando entre as Clínicas e o Paraíso, enxergando o rosto das pessoas como pétalas numa rama, exilado e morrendo de saudade da Praia do Futuro e da marcação dos
triângulos pelas ruas chapadas à luz, e os oitizeiros; te escrevi. E sem qualquer esperança que
me respondesses. Afinal, já iam uns bons três anos que eu não
publicava nada nos jornais de Fortaleza, e, como sabes, as pessoas
esquecem rápido. E nem blogue a gente tinha àquela altura do returno.
Além
disso, estavas uma geração adiante. O que é bastante e suficiente para que a gente se olhasse em prevenção. E, como se não bastasse, aqueles eram tempos de conexões discadas e precárias. E de
imeios semelhantes às promessas de encontrar, que a gente
sempre faz a amigos distantes e conhecidos próximos, a saber que
nunca que irão acabar em boa cerveja. Quer dizer, era bastante incerto
se chegavam ou não.
O
fato é que aquele chegou.
E
que me respondeste.
Nunca
convivi contigo, meu velho. O máximo que trocamos, um aperto de mão
– pode ser? – numa dessas cerimônias inglórias de lançamento
de livro no Ideal ou ali no subsolo da Biblioteca. Ou seja, onde ainda há laquê no penteado da
primeira dama e alfinete na gravata do “anfitrião”. Ou onde mais seja em que a
pompa, oca, um pouco estúpida da Academia, haveria de te rejeitar de
véspera.
É.
Mudei de servidor. Parece que também mudaste. Perdi todos os imeios
daquele tempo. E o que me escreveste, em resposta, foi junto. Mas sei: aquilo foi mais que virtual. Foi mais da ordem do humano que da doutrina do homem de letras. E
deixa eu ver se entendi: e não é melhor assim? Para poder
calar-nos em paz?
Mas
hoje, Airton, eu vou pagar uma cerveja. E tomá-la lentamente e
sozinho. Pensando em roubar manga no quintal e em São Francisco de
Assis. Nas divas do cinema, que também encontravas pelas praças do Benfica. Em Noel Rosa e na Rua Dom Jerônimo. Na Perna Cabeluda e em Chet Baker. Em Freud, em Trótsky e no Baleia, o garçom. Pensando num mundo sem smartphones, mas com tertúlias imemoriais, nas quais os Fevers e o Rei cantam diferentes versões de "Agora, eu sei", para sempre. Nas mitologias que
criastes desde a Gentilândia. No glorioso Leão do Pici – que sequer é meu time. E no sereno das madrugadas caindo sobre as teclas da tua máquina
aposentada
de pouco.
Como gostaria de ter escrito este texto, simplismente assino em baixo.
ResponderExcluirabraços
jairo costa
Ruy,
ResponderExcluirSua crônica me comoveu. Muito. Muitíssimo.
Airton foi o primeiro escritor que conheci pessoalmente.
Eu era então um jovem, esquelético e barbudo estudante de filosofia.
Ele, à época, me “adotou”. Leu meus textos juvenis e me incentivou a seguir adiante.
Ficou aqui um buraco no peito.
Compartilhei seu belo texto no facebook.
Abraços. Saudades.
Lira
Ruy, meu amigo poeta,
ResponderExcluirFortaleza, nossa aldeia, perdemos o olhar do poeta.
Cuidemos de ver.
Tanta beleza assim de companhia carece a olhar.
Tanta emoção.
Obrigado por me transbordar, poeta.
Kelsen