segunda-feira, 25 de junho de 2012

Melodia a régua e esquadro: as sanidades de São Paulo


Vilanova Artigas e Carlos Cascaldi, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (Fau-Usp), São Paulo

Quando chegou a vez, achei o Rio de uma beleza fácil e carcomida. Pois, de outro modo, o Rio ainda é o mesmo mar do Nordeste. Só que menos atraente, apesar das montanhas e certo efeito pirotécnico o tempo inteiro, não só na Passagem de Ano. A sensação de o cartão-postal não dar descanso. E a fealdade das favelas roendo os morros. A mim sempre me impressionou mais São Paulo. Sua beleza áspera e arquitetura moderna, de um classicismo ressaltado, equilibrando-se sobre pilotis. Certa visão diáfana de um futuro do passado, como num condomínio de Vilanova Artigas, em Higienópolis. Ou o quanto o Conjunto Nacional, com sua praça interior, cita - de forma  adequada, inopinada - os mercados e feiras do Nordeste. A promessa de calor na fria impessoalidade dos espaços. E se está melhor num boteco debruçado sobre a Paulista ou na balada de Vila Madalena, no inverno, que em Copacabana. O Rio é chafurdo tão gostoso quanto raso. É-se amigo de todos logo, animadamente. Mas só por umas horas. Em São Paulo há mais prazos para antes e depois. O silêncio surge um pouco mais. E nele se esconde um naco de pouso e insuspeitado passado. A chuva fina borrifando esquinas. Possibilidades de estudo. Às vezes, quebradas pelos raios das grandes tempestades de verão abatendo-se sobre os vales, onde a metrópole e a quitanda se misturam. A fascinante franja entre o que é do bairro e do país. Circular anônimo pela Pompeia. E almoçar contemplando a Igeja de São João Vianey. A distância recente no traço das pessoas. E o tanto que elas se parecem nas suas diferenças. A migração segue por todos e tudo. Na pressa de tudo. Até no fato de se ir para o mar pela serra a toda, sem tempo de ver paisagem. E a serra mergulhar no mar depois daqueles elevados fantásticos, que parecem o desdobrar da cidade no rumo do oceano. E os ipês, os manacás, as quaresmeiras em flor no meio da mata. Ou imaginar os padres da Companhia escalando aqueles despenhadeiros e grotas, no muque, cinco séculos antes. Ou a gente estar sempre a dirigir um conversível, não obstante o teto, quando se vai a Ilhabela ou Cambury. E, assim, as tais curvas da Estrada de Santos, mais presentes em São Paulo que no Rio, onde elas de fato estão.

Esse negócio de escolher entre São Paulo e Rio é uma espécie de dialética. E há compensações à beira-mar ou na montanha. Mas parece meio inevitável que a gente se decida por uma das premissas.
*
Recentemente, meio por acaso - se há acasos e não constelações na Tia Nete - vi um curta, de minutos poucos, sobre São Paulo, cuja elegância, simplicidade, ritmo, escolhas, chamam a atenção: 
 [o filme dura 3min52s, é precedido por um comercial de 21s, e põe em quadro uma pequena amostra da melodia de régua e esquadro que destila algumas das (raras) sanidades de Sampa]

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