sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Ano admirável: Larkin e o verso como notação de momento


Bill Brandt, 1953


Annus Mirabilis


Sexual intercourse began

In nineteen sixty-three

(which was rather late for me) -

Between the end of the Chatterley ban

And the Beatles' first LP.


Up to then there'd only been

A sort of bargaining,

A wrangle for the ring,

A shame that started at sixteen

And spread to everything.


Then all at once the quarrel sank:

Everyone felt the same,

And every life became

A brilliant breaking of the bank,

A quite unlosable game.


So life was never better than

In nineteen sixty-three

(though just too late for me) -

Between the end of the Chatterley ban

And the Beatles' first LP.


Philip Larkin



Annus Mirabilis


O começo da transa foi enfim

Mil novecentos e sessenta e três

(um tanto em atraso para mim) -

Entre o Chatterlay sair da censura

E os Beatles lançarem a loucura.


Á altura só entrara na dança

Uma espécie de barganha

Uma disputa pela aliança,

Aos dezesseis, uma falta de sanha

Que se estendia à toda a artimanha.


Súbito a briga acabou

E todos sentiam-se iguais

E toda a vida virou

Uma brilhante quebra da banca,

Um jogo de entrada franca.


Não houve vida mais bela

Que nos idos de sessenta e três

(para mim, tardia chancela) -

Entre o Chatterlay sair da censura

E os Beatles lançarem a loucura.





Nota - Ah, quanta falta na tradição de poesia brasileira recente de registros assim. Algo que ponha poesia - em toda sua graça - a serviço da crônica ou do momento. Não há regras. Tem horas que é preciso esquecer que há eternidade e perenidades. E simplesmente render-se ao momento, à gandaia. Afinal, quem diria que este Larkin é o mesmo que escreveu versos da solenidade de: "Onde viver, senão em dias"? O Chatterlay referido trata-se do romance de D. H. Lawrence O Amante de Lady Chatterlay [Lady Chatterlay's Lover], que durante anos foi proibido na Inglaterra. Realmente, poucos poetas conseguem ser tão ingleses quanto Larkin. Reparem no refinado auto-humor com que ele lamenta já estar um pouco além do ponto, maduro em excesso, em 1963 ("Though just too late for me"). Em 1963, Phllip Larkin tinha 51 anos. É estranha a empatia que nutrimos por determinadas épocas que sequer nos foram dadas viver. De minha parte, tenho saudade de tempos felizes em qualquer época. Eles parecem um advento, uma 'parousia'. Permanente possibilidade. É assim com 1963. E olha que nos dois primeiros meses desse ano eu sequer havia nascido.


3 comentários:

  1. Com afeto também flano pela saudade de tempos felizes.

    Quando te leio, encontro a poesia em toda a sua graça.

    Quanta beleza, Ruy!

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. bacana, kelsen. qto. tempo! outro dia, estava lendo o seu livro 'VENTOS DA ESPERANÇA' pra minha menina de quatro anos. mto. legal: texto e ilustrações.

    abs.

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