segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Três temas dos tempos de algum ontem

A Estação Ferroviária de Camocim em foto da década de 30

1. "Que acaba de partir da praça" 

Parque Araxá” foi composta em 1986, um ano de muitas descobertas e de intenso comércio com o pessoal do Grupo Latim em Pó, que se dissolveu no começo do ano seguinte. Eles representaram mais que uma graduação intensiva não só em música, em artes (e, muito mais importante, na vida). Mas a canção não chegou a ser tocada pelo grupo. A letra faz referências a temas do dia a dia, como ter de tomar um ônibus diariamente na Praça José de Alencar para ir ao Campus do Pici (onde fazia Computação), e achar que a palavra “araxá”, vista de relance no letreiro de um outro ônibus, era bela, evocativa, e portava uma espécie de síntese secreta e inalienável. Mas também faz referência à Odisséia (a “Aurora de róseos dedos”), que lera maravilhado àquela época. A canção foi gravada pioneiramente por Marcus Britto (que atualmente assina seus trabalhos como Marcus Caffé). E posteriormente por Idilva Germano. E ambas as versões me agradam bastante.  A primeira é arejada, contemplada por certo humor resignado na voz de Caffé, e possui samplers característicos de meados dos anos 199o (um dia ainda vou precisar dizer pessoalmente ao Marcus o quanto gosto de sua versão). A segunda, de quase dez anos depois abre um primoroso disco de jazz com uma atmosfera de música de câmera, ao modo de uma sorte de Lied. Esta gravação caseira, abaixo, foi feita ao final de 2009. E consiste apenas de violão e voz. Deem nos ouvidos os devidos descontos: para o violonista amador e o compositor bissexto: 






2. "No Oeste, eu sei"

Parodiando Pete Brown” foi escrita em parceria com Domingos Fazio um ano depois do “Parque”, em 1987. Foi um tempo de uma intensa e calma solidão, porque os amigos haviam partido e se instalado em Tatuí, no interior de São Paulo, para estudar música no conservatório famoso. Não havia muito que fazer a não ser ler, tocar violão, estudar um pouquinho de teoria musical, enquanto me preparava para o mestrado. Mas antes disso, fui passar o Carnaval em Recife, e Domingos, que estava morando lá, me mostrara um tema que, achei, tinha a ver com western. Era em tom menor e um bocado plangente. Depois acresci algumas partes ao tema original de Domingos e à letra, que escrevera nos intervalos do Carnaval de Olinda. Pete Brown foi o letrista de algumas canções de Jack Bruce, do Cream. Entre elas, “Theme for an Imaginary Western”. Western e cinema confundiam-se em Camocim, durante a infância. Filmes de faroeste foi onde passei parte da minha infância. Se não era western, não era propriamente filme, tal a paixão que tínhamos pelo gênero imortalizado por Ford e Wayne. Por isso quando digo na letra: “No Oeste, eu sei”, desejo (também) referir-me expressamente a Camocim, que fica no oeste do Ceará. E que à época possuía um elemento emblemático dos westerns: uma ferrovia. Possuía também um rio com um delta de mangue. E cujas praias desertas e devastadoramente belas, como Barra dos Remédios ou Tatajuba, tinham muito daquela locação do deserto. Nesta gravação, de 2010, usei dois violões e algumas vozes sobrepondo-se em certas passagens. O registro é tão artesanal quanto o anterior:






3. Para Leamington e mais além

Royal Leamington-Spa é uma cidade de águas termais com bela arquitetura vitoriana e que fica há só uns poucos quilômetros de Coventry, onde morei no início da década de 90. As viagens de trem até lá eram fantásticas, como quase qualquer viagem de trem. Como as que fazíamos na infância, entre Camocim e Fortaleza com uma baldeação em Sobral. E ainda mais na Inglaterra, com ramais para todos os lados, aqueles campos e bosques desenhados à mão e de onde sobressaem campanários normandos, jardins e pequenos cemitérios rurais. Aquela paisagem mais "racional", antiquíssima, cruzada por rios que já correm ali desde à época das Cruzadas e muito antes, quando o Imperador Adriano mandou erguer muralhas a nordeste da Cumbria, por exemplo. (Era quase tão bonito quanto no Ceará. Mas, claro, Ceará há só um, e uma infância). Agora, Leamington, mais ao centro, é apenas há uns poucos quilômetros de Stratford-on-Avon, terra natal de Shakespeare e o próprio coração da Inglaterra: o Warwickshire. E há muitas boas recordações que se cristalizaram neste teminha chamado de “Journey to Leamington”: uma atmosfera de evocação e também algo de estrada-de-ferro. Registrei-o com um violão, algumas guitarras (em afinação alternativa) e voz. E preferi não pôr uma letra como forma de chamar atenção para a melodia. A gravação caseira é da mesma época da composição do tema: julho de 2010. Foi um tempo em que voltei a tirar o violão debaixo da cama e compor alguma coisa pensando em utilizar os temas como trilha de um documentário que estava editando:




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