domingo, 29 de junho de 2008

De promessas & alguns lugares comuns

Rosenthal Porzellan A.g.,  c.1958

Dos três poemas abaixo & de contos do vigário pelo planeta afora

Veja os três poemas abaixo ("Sonnet", "The Sting", "Not Yet My Mother"). São  escritos por autores jovens, de quem se espera algo, no universo da poesia britânica contemporânea. Os poemas, no entanto, são apenas corretos. Certamente melhores – no sentido também de mais vários – do que o que se publica hoje em dia no Brasil. Mas não muito. E, como foi dito, nada há de particularmente conspícuo neles. O primeiro ("Sonnet") joga bem com a coloquialidade – o que é um exercício difícil. O terceiro ("Not Yet My Mother") tem um único verso fora de série (deduza qual!) e um bom final. O do meio possui boas imagens, embora seja decalcado de lugares-comuns: a culpa católica, a descoberta da sexualidade dos pais, etc. A autora deste, aliás, Patience Agbadi, é também ungida por lugares-comuns, no sentido de ser apresentada como estereótipo da jovem poeta do primeiro mundo. Vive em Londres; mas é negra, portanto faz parte de uma minoria étnica. Descende de uma minoria cultural, já que é filha de imigrantes nigerianos, e, logo, provem das ex-colônias. Assume-se como lésbica, portanto pertencente a uma minoria sexual. E é mulher, portanto parte de um gênero perseguido e que devemos olhar com condescendência. Quer dizer, ela já sai sextuplamente mais qualificada para os padrões atuais. Em franca vantagem no panorama hodierno, diante, digamos, de um escritor 1. branco anglo-saxão, 2. heterossexual, 3. metropolitano,  4. do sexo masculino, 5. de uma família de classe média para alta e 6. religioso (em especial católico). Não estou hostilizando, aqui, nem de longe, a condição da escritora em questão ou menosprezando suas conquistas - seu poema é bem elaborado e ela possui suas qualidades e é apresentada como promissora por um importante jornal inglês (The Guardian). Estou apenas deplorando que se tomem tais critérios como determinantes para analisar méritos literários, como fazem alguns. Mas será que tem alguém que acredita mesmo nesses contos de carochinha ou de vigário? Ou seja, crê que há uma escritura feminina, étnica, de gênero? Deve existir. Mas não faz muito o gênero de quem lê com o mínimo de sinceridade ou consequência. Bons escritores não o são por serem fêmeas ou machos; casados ou solteiros; veados ou heteros; lésbicas ou straights; ninfos ou beatas; religiosos ou leigos, de esquerda ou de direita; metropolitanos ou colonos; negros ou brancos; mestiços ou "puros"; ricos ou remediados; torcedores do flamengo ou do olaria; sádicos ou masoquistas; bispos ou juízes de fora; comedores de ópio ou antropófagos; patriotas ou traidores; franceses ou papua-novaguineenses; aidéticos ou sifilíticos; motoristas ou pedestres; honestos ou ladrões; desembargadores ou líderes sindicais; melômanos ou artistas gráficos; com duas ou com uma corcova;  fãs da Disney ou da Warner; com dobras ou desdobrados; fiéis de Padre Cícero ou tradutores de Cícero; da cidade baixa ou do castelo; maconheiros ou caretas; da aldeota ou da megalópole; gibelinos ou guelfos, etc.

Bons escritores são bons escritores, porque, entre outras coisas, conseguem justo escapar a qualquer classificação em moda durante algum tempo.  Como algumas das ruidosas classificações criadas nos cursos de Creative Writing ou Cross-Cultural Studies


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