é
claro que o carnaval libera e subverte, como ensina Bakhtin. E se o
Carnaval é um elemento central de nossa cultura, é porque há
cargas de sanidade nela. [Quer dizer, por contraposição a outras,
que são menos digestivas ou barrocas, como a europeia, onde essas cargas de contrariedade são sublimadas, reengolidas, como quando não se cospe o catarro após o escarro]
mas
também quando há só Carnaval, quando há só sarro o tempo inteiro, o Carnaval é
suprimido
e domado. E organizado. E deixa de sê-lo
transforma-se
em algo passivo. Apropriado pelo latifúndio, pelo consumo, pela
mídia mais normativa e medíocre. Pelo espírito UDN da vez. Pela Une. Pelo Departamento de Ciências Sociais. Por tudo que há de mais sectário, cartorial e torpe. E, assim, por
essa estranha dialética, o Carnaval torna-se, do contrário, algo
mesquinho, autoritário. De uma festa que concentra o melhor das inadaptações sociais, ele se torna um repositório de superadaptações. A própria capital dessa sociabilidade carnavalizada
ora, já foram suprimidos muitos elementos que contrastavam com o
Carnaval. E porque contrastavam com o Carnaval, também o desafiavam e definiam. O limiavam melhor, por contraste. É o caso da Quaresma
a Quaresma já foi um elemento essencial para a definição do
Carnaval. Não é mais. E se não é mais, é porque o Carnaval também não é mais o que era. Pois à mesma medida em que a Quaresma foi deixando de ser, o
próprio Carnaval também tornou-se, por seu turno, menos subversor. Menos ele mesmo: uma etapa de delírio, de inversão de valores, que antecipa fastio e austeridade
e por quê? Porque tornou-se norma. Algo domado. Porque retirou-se do Carnaval
seus germes de subversão. Hoje qualquer cidade sem uma tradição
orgânica de Carnaval popular, como Fortaleza, pode ter sua micareta
em julho ou agosto – ou em que mês mais for
e
o Carnaval que tinha data, hora e prazo e lugar para acontecer, por contraste
a outros motivos, agora é algo portátil ao longo do ano. Algo meio
descartável. Ou amoldável aos interesses puramente econômicos por
trás da organização dessas micaretas
o Carnaval é algo precioso demais para ser banalizado e pulverizado, por meio de micaretas fuleiras, ao longo do ano. Aliás, já há festa demais no país. O perigo, então, é da festa - quando menos se esperar - brotar a polícia e a censura
o Carnaval é algo precioso demais para ser banalizado e pulverizado, por meio de micaretas fuleiras, ao longo do ano. Aliás, já há festa demais no país. O perigo, então, é da festa - quando menos se esperar - brotar a polícia e a censura
Nenhum comentário:
Postar um comentário