Robert
Motherwell, 1982
'Você que enganou'
Você que enganou um homem simples
Às
gargalhadas, em flagrante delito
E
mantém um bando de esbirros à volta
A
borrar a linha entre o bem e o maldito,
Embora
todos se curvem ante você,
A gabar-lhe os dons: o saber que ilumina,
Conferindo medalhas de ouro em sua honra,
Contentes
de chegar vivos à esquina,
Não se sinta seguro. O poeta lembra.
Um você manda matar, outro nasce.
As palavras, anotadas: as datas, os vezos.
E
numa manhã de inverno, em melhor impasse:
Galho curvado por corda sob seu peso.
Czesław
Miłosz
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NOTA POSTERIOR [05.11.12]
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NOTA POSTERIOR [05.11.12]
é complicado. A gente lê um poema. O poema é lindo. O poema se chama "Który
skrzywdziłeś"¹ [ou "You who wronged", em inglês]. A partir de algumas sonoridades no polonês e da tradução do sentido geral para o inglês, a gente fica morrendo de vontade de partilhá-lo com mais gente. Com os amigos. E então esboça uma versão apressada e meio urgente. A gente dirige prioritariamente a atenção para reproduzir sons e assonâncias, e deixa passar uma concordância verbal incorreta como:
"a dizer que a virtude, o saber lhe ilumina"(m) [v. 6]
até pode-se supor que a vírgula faz as vezes de "ou" em vez de "e". ou que há sínquise na frase "a dizer que a virtude". mas ainda assim... soariam como ressalvas, ambas justificativas. uma concordância tão simples, plural: no afã de achar uma rima, a gente cega. E só vai perceber depois, o logro. E é preciso consertar, claro. Porque se foi muito afoitamente ao pote e ao concerto. Antes de tudo. Antes de mais. Quer dizer, pôs a música das palavras (melopeia) por riba até do jogo das ideias, da trama conceitual (logopeia). Ou seja, pôs o concerto diante do conserto. Às vezes, uma impressão, mera hipótese: quando se lê demais em outros idiomas, abre-se espaço para alguma debilidade gramatical em alternância, variação. No idioma da gente. Na casa da gente.
Mas também a memória prega muitas peças. O primeiro verso de um de meus sonetos favoritos, de Luís de Camões, mal citei por aqui, num post, como sendo: "Enquanto quis ternura que tivesse". E na verdade é: "Enquanto quis Fortuna que tivesse". (Naturalmente Fortuna, aqui, no sentido de sorte, destino, etc.)
¹Para ouvir uma canção (em polonês) em que este poema (cujos versos encontram-se inscritos em um monumento de Gdansk, em memória de operários mortos pelo regime comunista) é proposto com letra:
Mas também a memória prega muitas peças. O primeiro verso de um de meus sonetos favoritos, de Luís de Camões, mal citei por aqui, num post, como sendo: "Enquanto quis ternura que tivesse". E na verdade é: "Enquanto quis Fortuna que tivesse". (Naturalmente Fortuna, aqui, no sentido de sorte, destino, etc.)
¹Para ouvir uma canção (em polonês) em que este poema (cujos versos encontram-se inscritos em um monumento de Gdansk, em memória de operários mortos pelo regime comunista) é proposto com letra:
'Który
skrzywdziłeś'
Który
skrzywdziłeś człowieka prostego
Śmiechem
nad krzywdą jego wybuchając,
Gromadę
błaznów koło siebie mając
Na
pomieszanie dobrego i złego,
Choćby
przed tobą wszyscy się kłonili
Cnotę
i mądrość tobie przypisując,
Złote
medale na twoją cześć kując,
Radzi
że jeszcze dzień jeden przeżyli,
Nie
bądź bezpieczny. Poeta pamięta.
Możesz
go zabić - narodzi się nowy.
Spisane
będą czyny i rozmowy.
Lepszy
dla ciebie byłby świat zimowy
I
sznur i gałąź pod ciężarem zgięta.
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