sábado, 13 de setembro de 2008

Por onde passa a escritura dos amigos


Raymond Pettibon, To take a great writer at his word..., s/d


Três coisas que leio

1. Estranho caso do homem da Governador Sampaio
Os 25 micro-contos de Aldir Brasil Jr. desvelam, de passagem, uma Fortaleza saindo da província e caindo n'outra maior. Ou no mar da memória. Típico caso de “o buraco é mais embaixo”. Envergonhadamente afetivos. A ocasião faz o ladrão. Por algumas frações de segundo, abrasivos. Experiência de vida individual inscrita no coletivo. E vice-versa, como deve ser. Micro-história refratando sociologias. Sabor de bairros. Concreção de nomes, tempos, espaços. Ruas e becos da reminiscência cruzando-se em meandros compressos. E indo dar em pátios de colégios -- ou do culégio, com dizia um velho diretor. Gestos próprios. Por vezes, espúrios. Portrait geracional. A irrecuperável, mitológica década de 70. Por enquanto, só em manuscritos. A circular entre amigos.

2. Devo morrer nas próximas três horas. Talvez quatro.
As postagens do blogue Dessincronizado. Nelas um estudante de letras em Fortaleza – depois em Belo Horizonte – professa o mundo ao sabor de uma extravagante, bela e arriscada condição: a de ser jovem. Entre outras, ele decreta que a poesia brasileira há de ser salva por Adriano Espínola e pelo poeta carioca – cujo livro de estréia ainda não se havia lançado, quando dessa assertiva – Cláudio Neves. E, no entanto, do alto de sua fleuma, certo ar blasé, dose de alheamento, velha e boa arrogância juvenil, há idéias próprias, noções muito vívidas e um humor, por vezes, corrosivo. Inclusive quando, de sua condição de anglófono – na tradição de Machado e Sterne –, faz pouco de certa pulsão dos franceses para complicar ainda mais um mundo que já anda um bocado encrencado.

3. Que diabos há entre a literatura e galões de gasolina?
Outro blogue, ainda incipiente mas que promete, é o Sursum Corda. Ao menos tão bem escrito quanto o anterior, dotado da mesma gana juvenil, e com coisas do tipo:

-- Ei, sabe aquele autor?
-- Quem?
-- O Sartre! Aquele do livro da capa azul.
-- Hum, sei não. Conheço não.

Vejam como Sartre é reduzido a uma capa azul. Reparem como os nãos estão todos ao final. Não é assim que falamos em Fortaleza?


p.s. -- depois falo do livro de Cláudio Neves (De Sombras e Vilas), que merece resenha a parte.

2 comentários:

  1. Ruy,

    Perdi contato com o Aldir, com quem trocava mensagens via Orkut, e eventualmente através de email. Não o conheço pessoalmente, embora seja ele seu amigo e possua um colega de departamento que é meu vizinho no prédio onde moro.

    Quanto à referência, muito obrigado. Grande parte do que escrevo é decorrência ao menos oblíqua de discussões que tivemos em aulas, mas também em outras oportunidades, como você sabe.

    Grande abraço,
    Daniel.

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