sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Piranha Ochse - a Alemanha e a Crise Portuguesa



Esta semana, Portugal foi escolhido como boi de piranha pelos alemães para indicar o que não deve ser feito na Europa em termos econômicos. Com as recentes crises em economias periféricas da Zona do Euro, se nota melhor a disposição de mando dos alemães. Ela tende a se intensificar no decorrer do tempo. E como a crise ainda irá aprofundar, é bom os portugueses irem acostumando, porque os gregos já sabem o que é bom para tosse. O paroxismo é aziago apanágio deles. 
Só esta semana foram mais 15.000 postos de trabalho no setor público evaporando. O salário mínimo foi reduzido em 22% na república helênica. E a economia grega encolheu 10% nos últimos dois anos. Um em cada dois jovens está a ver navios passando entre as belas ilhas em que Platão e Aristóteles ensinaram o Ocidente a pensar. E o ajuste está apenas no começo. Até porque os ministros de finanças da Zona do Euro não entenderam que as medidas de austeridade tomadas ontem pelas autoridades gregas sejam suficientes. Do contrário, julgam que é necessário um pacote de medidas ainda mais severo para se chegar a um acordo inicial. 
Não se subestime o papel da comunicação nesse processo. Quando se está em crise, o que se diz fora do país ganha tremenda amplificação. E declarações do gênero das feitas na Alemanha podem deprimir. Não fazem nada bem ao estado anímico das pessoas. Elas se veem impotentes diante de macrodecisões equivocadas, tomadas ao longo de anos por políticos, altos burocratas. Algo que passa à margem do controle delas. E vem a público anos depois, revelando dados e conjunturas impossíveis de não serem sabidas por altos escalões da administração. Mas, ainda assim, são as pessoas na rua que mais sentem a soberania do país indo pelo ralo quando ouvem essas duras prescrições vindas de fora. Ninguém gosta. E lembrar que a maior hiperinflação já registrada se passou justo na Alemanha, no início da década de 1920.
Mas quanto a Portugal, primeiro foi Angela Merkel, que criticou o modo como foram aplicados os fundos da União Europeia na Ilha da Madeira. Em estradas e túneis, segundo ela, ao invés de serem utilizados para fomentar o empreendedorismo, a competitividade. Mas se os portugueses decidiram rasgar estradas e abrir túneis na Ilha da Madeira - aliás, de grande potencial turístico - o que Dona Merkel tem mesmo a ver com isso? 
Se não bastasse, logo a seguir, uma declaração inusitada, duríssima, de Martin Schulz, presidente do Parlamento Europeu, foi parar na manchete principal do Público. Ao comentar o fato de o primeiro-ministro português, Passos Coelho, seguir a Luanda para tentar captar investimentos do governo angolano, Schulz disse: “o destino de Portugal é o declínio”. Não é exatamente um vaticínio que caia bem na boca de um presidente de Parlamento Europeu. Há que ser diplomático, assertivo num cargo dessa magnitude. 
No caso de Schulz, o que ressalta é a preocupação alemã com Portugal buscar soluções fora do âmbito da União Europeia. Pois quanto mais Portugal voltar-se apenas para a Europa, for euro-dependente, mais será também germano-dependente. E isso vale para qualquer outro país da Zona do Euro. Inclusive para França, Itália e Espanha. Todas elas, indistintamente, com graves problemas financeiros por diante. A montagem da União Europeia foi feita no sentido de privilegiar os mais disciplinados e fortes economicamente. Ou seja, os alemães. Adenauer já sabia disso na década de 50, quando deu largada ao processo de unificação, ratificada aos poucos por raposas velhas como Willy Brandt ou Helmut Kohl.
E, no entanto, não é através de gafes, como as praticadas pelos alemães, que se tira a real medida de como anda o prestígio internacional de um país?
Até onde se sabe, contudo, Portugal ainda é um estado nacional, autônomo e independente. É assim há nove séculos. Um bocado de tempo. Frente a esse tempo, aliás, a Alemanha se unificou um dia desses. E é como se os comentários alemães fossem produzidos tomando como certo que a soberania portuguesa já se encontra completamente pulverizada, transferida, como eles almejam, para o âmbito da União Europeia. 
Ninguém fala tanto em União Europeia, nem a defende com mais veemência, dentes e unhas que os alemães. Enquanto dos três grandes, os ingleses são euro-cépticos, por diversas razões; os franceses, os mais enciumados com o poderio alemão, e muito longe de ter o mesmo poder; os alemães apontam para os países mais atolados em dívidas, já de cima para baixo, como se estivessem, então, a reportar-se a um estado ou província na periferia da Bundesrepulblik. Pois será exatamente cada vez mais isso dentro de algum tempo. O que eles não conseguiram em duas guerras, seguem logrando via economia: unificar a Europa sob a tutela alemã.

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